Para se manter vivos, eles não podem ficar em casa

A pandemia e o drama dos doentes renais crônicos: entidades cobram proteção especial a 130 mil pacientes que fazem hemodiálise

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A recomendação que mais se ouve nessas últimas semanas, quase como um mantra, é: fique em casa. O isolamento social é a orientação que mais faz sentido no cenário atual do país e que, comprovadamente, pode ajudar a conter o avanço exponencial do novo coronavírus. Mas como ficam os 130 mil pacientes renais crônicos do país que precisam se deslocar de suas casas, geralmente três vezes por semana, para continuar seus tratamentos nos centros de diálise, em sessões exaustivas que duram de três a quatro horas e, consequentemente, se manterem vivos?

Embora estejam no grupo de risco para desenvolver as complicações causadas pela Covid-19, ao contrário da maioria de idosos ou outras pessoas com doenças crônicas ou autoimunes, os renais crônicos, definitivamente, não podem ficar em casa. E precisam de atenção especial nas unidades hospitalares. A Aliança Brasileira de Apoio à Saúde Renal (Abrasrenal), que representa os renais crônicos de todo o país, alerta para o risco real de contaminação em massa de pacientes, famílias e profissionais de saúde.

Por que eles não podem ficar em casa?

De acordo com a Aliança Brasileira de Apoio à Saúde Renal (Abrasrenal), até 31 de março havia um caso confirmado de paciente renal com Covid-19, nove suspeitos e um óbito entre os aguardando confirmação. Segundo a entidade, além de ser grupo de risco para agravamento do coronavírus, os doentes renais estão mais expostos porque não podem ficar confinados em casa por causa do tratamento e precisam circular pela cidade para receber o tratamento de diálise de três a cinco vezes por semana.

Esse é um grupo significativo da população que é obrigado a usar transporte público e transitar para dialisar, se não morre. Eles têm uma exposição maior porque já são mais suscetíveis imunologicamente e, se forem infectados, expõem os demais pacientes das clínicas de diálise”, destaca o diretor-geral da Abrasrenal, Gilson Silva.

A falta de realização de exames de diagnóstico de coronavírus em todos os pacientes suspeitos é um fator que aumenta ainda mais a preocupação. “Esses pacientes frequentam clínicas e dividem salas de diálise com outros 30, 40 doentes, todas as semanas. Em algumas clínicas, chegam a circular 400 até 500 pacientes”, reforça Gilson, que também é renal crônico. Além disso, esses pacientes precisam ir a postos de saúde para buscar medicamentos para anemia e doença óssea e também terão que ir para a vacinação da gripe.

renais crônicos correm mais riscos

Relatórios da Organização Mundial da Saúde e do Ministério da Saúde colocam as pessoas que têm doença renal crônica dentre as mais suscetíveis às complicações do Covid19. Isso significa que o maior acometimento pulmonar e a consequente necessidade de internação é mais frequente neste grupo do que na população geral.

A maior parte dos pacientes com DRC também apresenta pelo menos outro fator de risco: hipertensão e/ou diabetes – as duas maiores causas de doença renal no Brasil e no mundo, assim como idade avançada. De acordo com o censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), 66% dos renais crônicos têm hipertensão ou diabetes. A idade média é de 58 anos, sendo 35% deles acima de 65, ou seja, a maioria tem mais de um motivo para estar no grupo de risco.

Serviço de hemodiálise em hospitais de campanha

A Abrasrenal, que representa os doentes renais em todo o país, está cobrando do Ministério da Saúde, estados e prefeituras que adotem medidas especiais para atender os pacientes renais durante a pandemia do coronavírus. A solicitação principal é que sejam montados nos hospitais de campanha de todo o Brasil um serviço especial para concentrar os doentes renais infectados pela Covid-19.

Outra solicitação é criar uma área de isolamento para pacientes em diálise suspeitos de coronavírus nos hospitais de campanha e testagem de todos os casos suspeitos. “Poucos estados, até o momento, planejam criar um espaço especial para internar doentes renais no hospital de campanha. Isso precisa ser implementado com urgência pelos estados”, afirma Gilson.

De acordo com o último censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), há mais de 130 mil pessoas realizando diálise no país, em cerca de 700 clínicas. A média nacional está em torno de 80% pacientes SUS em tratamento nas clínicas de diálise no Brasil, em apenas 7% do total de municípios brasileiros que contam com este serviço.

Pandemia pode levar à falência de clínicas de diálise

Diretor da Abrasrenal, Gilson Silva lembra que um agravante é a crise financeira e os desafios que as clínicas prestadoras de assistência aos pacientes renais crônicos em diálise vivem historicamente. “A situação financeira dessas clínicas é sabidamente ruim, com muitas delas acumulando dívidas por atraso de repasses e subfinanciamento do SUS à terapia, sendo que as clínicas em todo o Brasil atendem prioritariamente pacientes provenientes do SUS”, ressalta.

O presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT), Yussif Ali Mere Junior, reforça o posicionamento da Abrasrenal e alerta que é emergencial que o Ministério da Saúde também tenha uma atenção especial com este setor. “Diante desse quadro de pandemia, nossa maior preocupação é tratarmos diariamente de um público com debilidades específicas, aliada ao grande potencial de mortalidade que a Covid-19 pode atingir nesses pacientes”.

Para o presidente da SBN, Marcelo Mazza, se a pandemia pelo Covid19 atingir as clínicas de hemodiálise, provocará a necessidade de isolamento dos pacientes, abertura de turnos de diálises extras, aumento e reposição de recursos humanos em virtude da contaminação do staff profissional para a contenção a do vírus. Por isso, segundo ele, é urgente a necessidade de aporte financeiro pelo governo federal pelo risco de insolvência das unidades e, consequentemente, falência no tratamento oferecido em todo território nacional.

De acordo com ele, o setor vive um quadro de subfinanciamento. Isso faz com que as clínicas percam sua capacidade de investimento, cujo resultado é uma superlotação das clínicas existentes, com redução de vagas para novos pacientes que se mantêm represados nos hospitais e o encerramento das atividades de clínicas em todo o país. “A SBN alerta seus representantes e o governo na esfera federal, estadual e municipal que o enfrentamento desta situação é inadiável”, ressalta Mazza.
Fontes: Abrasrenal, ABCDT e SBN

 

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